Gisele Maia
Salvatore
Morici chegou no Brasil aos dezoito anos e até hoje se lembra
da data precisa: 11 de fevereiro de 1961, um sábado de Carnaval.
Mas não foi a festa popular que o trouxe ao país. Ele,
então um jovem jornalista, tinha como objetivo uma reportagem
no Amazonas, com o desbravador Willy Aureli, que havia feito descobertas
importantes na região do Araguaia. Foram necessários poucos
dias até que sua viagem tomasse novos rumos e ele decidisse ficar
por aqui de vez. Para isso, bastou se apaixonar por uma linda ítalo-brasileira,
Regina Helena Farabotti, com quem se casou. Atualmente, ela é
responsável pelo cardápio de primeira do Taormina Ristorante
Siciliano, localizado na cidade de São Paulo. O empreendimento
da família Morici existe há apenas dois anos e, como brinca
Salvatore, “foi aberto unicamente para fugir da depressão
senil”.
Quando chegou da Amazônia, Salvatore foi convidado para a festa
de uma família de empresários italianos estabelecidos
em São Paulo, os Scavone. Lá, ele recebeu a proposta de
compor a diretoria da Oretri Propaganda, uma importante agência
de publicidade na época. Salvatore agradeceu o convite, mas recusou
devido ao regresso à Itália em poucos dias. Na mesma festa,
entretanto, horas mais tarde, ele conheceu Regina e, por causa dela,
não embarcou, apesar de já não ter mais “nem
um centavo”.
“Acordei no dia seguinte
ao que eu deveria partir, com fome e sem dinheiro. Fui numa feira perto
da Consolação, roubei umas cinco bananas e liguei para
o dono da Oretri”, lembra com alegria. Desde a opção
de se estabelecer em terras tupiniquins, Salvatore também passou
a colaborar com o Fanfulla, o jornal italiano que, segundo ele, chegou
a superar, em tiragem, o cotidiano Província de São Paulo,
o qual depois viria a se chamar O Estado de São Paulo.
Em 1965, o Fanfulla foi fechado
pela ditadura militar. Em 1966, Salvatore fundou um jornal, chamado
Itália Mondo, que durou pouco mais de um ano. Apesar do envolvimento,
ele conta que, aqui no Brasil, nunca ganhou dinheiro como jornalista.
Com formação superior também em engenharia, fez
trabalhos nessa área, além de ter atuado no mercado publicitário
e na indústria de produtos químicos. Sempre empreendedor,
montou uma tinturaria e duas estamparias de tecido. “Eu, que tirava
seis em química, aqui formulava produtos”, conta.
Posteriormente, Salvatore se tornou
conhecido por importar silicone e introduzir o produto no mercado brasileiro,
principalmente junto aos fabricantes de colchões. Em 1977, ele
podia se considerar um homem rico. Mas, neste mesmo ano, houve a maxidesvalorização
do cruzeiro. Com dívidas em dólar, Salvatore precisou
vender sua casa, terrenos e carros. “Eram dívidas normais.
Eu comprava principalmente da Alemanha, e era de praxe pagar em 360
dias. Então, eu, que possuía uma receita igual ao dobro
do meu investimento, paguei uma dívida duas vezes maior. Perdi
tudo e passei a odiar o Brasil. Voltei para a Itália em 1980
e jurei nunca mais por os pés aqui”.
Já na Itália, sua
mulher ocupou o cargo de direção de uma revista sobre
turismo. Em pouco tempo, Salvatore abriu uma agência de viagens.
Eram os sinais de recuperação da família Morici.
No entanto, mais uma mudança de planos aconteceu: o filho do
casal, que já havia prestado vestibular para o Instituto Politécnico
da USP, foi aprovado e decidiu que queria voltar para o Brasil. E assim
o fez. Logo a mãe o acompanhou. Salvatore, que quis manter sua
promessa inicialmente, acabou se rendendo e veio ao encontro da família.
Alugou sua agência de turismos lá e abriu uma outra em
São Paulo.
O sacrifício valeu à
pena. Salvatore conta orgulhoso a trajetória profissional do
filho que, durante nove anos, foi diretor da Parmalat e, atualmente,
é diretor de marketing da Coca-Cola. Já a filha é
diretora para a América Latina da ENIT (Ente Nazionale Italiano
per il Turismo), a Embratur da Itália. Além de ser vice-presidente
mundial da associação européia de turismo.
O bom atendimento do restaurante
e a qualidade do cardápio, que traz o melhor da mesa siciliana,
abriu outros caminhos. Hoje, o maior lucro vem dos eventos que Salvatore
e Regina organizam com o Buffet Dolci Momenti, outro empreendimento
dos Morici. Entre os clientes estão o GEI (Gruppo degli Esponenti
Italiani), o ICE (Instituto Italiano para o Comércio Exterior)
e outras instituições italianas. Apaixonado por suas raízes,
Salvatore também ajuda a promover encontros da Região
Sicília no Brasil, sejam eles de objetivos políticos ou
comerciais. A dedicação lhe valeu o prêmio Pigna
D’Argento, dado a sicilianos no mundo inteiro que se destacam
na divulgação dos valores da região. “Tenho
aqui na parede do meu restaurante um diploma de ‘sicilianidade’,
e sei que sou digno dele. Normalmente, meus compatriotas de outras regiões
se apresentam como italianos. Eu, antes de tudo, sou siciliano”,
comenta orgulhoso Salvatore.
Serviço:
Rua Peixoto Gomide, 1395 - Cerqueira Cesar – São Paulo
tel. 11-3284.3838