Há
quem afirme que o cooperativismo nasceu na Itália. Não
há provas concretas, mas há outra, esta irrefutável,
de que é na Bota, logo após a Segunda Grande Guerra, que
o modelo foi mais bem explorado e serviu de exemplo para outros mercados.
Da plena consciência da limitação individual, nasceu
o espírito agregador do pequeno empresário italiano, como
explica Enzo Maranesi, da Câmara de Comércio Ítalo-brasileira
de São Paulo, que desencadeou o surgimento de cooperativas, consórcios
de exportação e distritos industriais por toda a Itália.
E foi na agroindústria onde o modelo apresenta resultados extraordinários,
como na região da Emiglia Romagna, onde estas cooperativas transformaram-se
em grandes centros de produção e de distribuição.
Para chegar ao mercado externo, os produtos das cooperativas utilizam-se
das Câmaras italianas de Comércio no exterior e do ICE.
Apesar do sucesso interno, estes produtores apresentam, contudo, extremas
dificuldades para estender suas marcas ao mercado internacional.
Cenário bastante comum entre
os produtores italianos de vinho, dos quais apenas cinco conseguem marketing
externo.
- A maioria das empresas italianas
são pequenas, sozinhas não têm poder de fogo para
fazer ações promocionais. A limitação da
oferta italiana é justamente essa. Falo no caso do vinho, mas
serve também para outros produtos, mas é uma oferta caracterizada
pelo tamanho pequeno do produtor, portanto com pouca capacidade promocional
e publicitária. Isso explica porque a presença italiana,
como por exemplo, no mercado dos queijos, é relativamente restrita.
Falta tamanho para fazer as ações promocionais. Agora,
essas ações poderiam ser feitas pelas instituições
públicas - sugere Maranesi. Para ele, deveria haver uma ação
governamental para reverter esse quadro. Cada produtor deveria ter um
órgão o apoiando.
O azeite - segundo Maranesi, “um
dos melhores do mundo” – também sofre as conseqüências
da falta de marketing. O óleo italiano hoje não tem mais
de 4% do mercado brasileiro, enquanto a Espanha tem, aproximadamente,
50% e Portugal, 35%.
- Estive recentemente na Puglia,
uma das regiões que mais produz azeite. Lá, mais do que
cooperativas, há associações que defendem os direitos
dos produtores. Mas também a elas falta a capacidade de fazer
ações promocionais. O governo espanhol mantém há
anos escritórios no Brasil, responsáveis pela publicidade
do produto espanhol. A Itália não fez isso – assevera
Maranesi.
Dividir com os outros
Fazer cooperativas é
um fenômeno tipicamente cultural. Do ponto de vista racional é
sempre boa a idéia de associar-se a alguém, mas querer
ser dono de tudo e não dividir nada com ninguém são
barreiras, diria, emocionais e culturais difíceis de serem superadas.
Derrubá-las é extremamente importante.
O cooperativismo superou o descaso
do governo italiano no período pós-guerra e fortaleceu-se
tanto que alguns grupos enveredaram na distribuição do
produto acabado. A política, contudo, foi marcante nos primórdios
e, de certa forma, perdura mais timidamente até hoje.
- Existem cooperativas de conotação
de esquerda, as ‘vermelhas’. Há também outras
que não são dessa matriz. De uma certa maneira, no final,
o cooperativismo era ligado a ideologias – recorda Maranesi, citando
como exemplo de “vermelhas”, as cooperativas da Emiglia
Romagna. Na região, há, entretanto, espaço para
modelos híbridos, como a Compagnia delle opere, uma forma de
cooperação ligada a um movimento de matriz católica
conhecido por Comugnone e liberazione. Política e fé,
juntas.
Segundo Maranesi, a Campagnia delle
opere agrega mais de 15 mil empresas, que a constitui como uma inquestionável
potência econômica na Itália. Não é
para menos. Quando se juntam para ir às compras é uma
verdadeira festa. A cooperativa, por exemplo, quando se apresenta à
Fiat, não compra um ou dois carros, mas uma centena deles.
- É uma agremiação
para ajudar as empresas cooperadas, mas não existem entidades
com um produto próprio, com uma marca própria. Então
não tem competição. Da mesma forma não existe
cooperação entre uma cooperativa e outra – ressalta
Maranesi.
O Brasil, pelo seu potencial no
campo, pode se tornar terreno fértil também para o cooperativismo.
- A grande possibilidade de cooperação
está justamente com os pequenos agricultores, que têm pedaços
de terra tão pequenos que só servem para a subsistência.
Mas, juntando cem deles, se especializam nas produções
e, evidentemente, os rendimentos passam a ser muito maiores. Agora,
o problema é de ordem cultural. Cada um deles precisa superar
a fase de dizer ‘não, eu cuido de mim mesmo e não
abro mão de minha soberania’. Uma vez que decidam se juntar,
as vantagens são evidentes – assinala Maranesi.